A partir da metodologia apresentada na postagem anterior, o trabalho de campo com mais detalhes – incluindo a visita ao local, registro da apresentação, catalogação e caderno de campo – foi realizado em 35 apresentações. Desse total, aproximadamente 60% (20) foram apresentações indicadas por músicos, conhecidos, entrevistados ou por mailing. A Internet é hoje uma importante vitrine para os grupos e artistas divulgarem seus trabalhos e apresentações, sendo inclusive um meio através do qual os músicos fazem divulgação, contatos com produtores e agentes, cotações de preços de equipamentos, conhecem locais onde podem pleitear vagas, etc.
Podemos perceber pela Figura [2] que o trabalho de campo mantém o padrão do mapa anterior [1]. Devido à necessidade de critérios para a escolha dos locais, a pesquisa de campo se concentrou nos bairros com maior quantidade de equipamentos, nos eventos e ciclos de apresentações, e nas indicações dos próprios músicos. Pela distribuição espacial do trabalho de campo foi possível acompanhar, além dos deslocamentos espaciais de certos músicos e ouvintes, a maneira que os locais de apresentações musicais estão dispostos na cidade.
Dos 20 locais com maior taxa de ocorrência, metade são particulares enquanto a outra metade se divide em 6 SESCs (V. Mariana, Pompéia, Paulista, Consolação, Belenzinho e Pinheiros), Centro Cultural Banco do Brasil, Instituto Cultural Itaú, Centro Cultural São Paulo e Sala São Paulo. Ocupando as colocações 18º e 19º respectivamente, estes dois últimos são os únicos estabelecimentos realmente públicos.
Figura 2 – Distribuição espacial dos equipamentos onde foi realizado trabalho de campo no período de janeiro de 2003 a janeiro de 2004. O trabalho de campo mantém o padrão do mapa anterior, porém inclui locais de apresentações com pouca ou nenhuma divulgação.
O trabalho de campo foi essencial para entender de que maneira a música instrumental é realizada de fato e como se constitui a “experiência musical” nos locais onde ela ocorre. Também importante para o entendimento do fenômeno são as conversas informais e entrevistas realizadas com músicos em atividade, assim como ex-músicos e aposentados. O meio urbano metropolitano surge como o “palco” no qual se dá a produção e apreciação da MPIB ao mesmo tempo em que é o espaço de disputas e conflitos.
A cidade é o palco também da construção de musicalidades específicas dentro do gênero na medida em que foram constatadas diversas “linhas”, ou sub-categorias, indicadas pelos próprios músicos e ouvintes. Na busca por postos de trabalho os músicos são impelidos, por um lado a uma certa “especialização” em sua linha e por outro, uma versatilidade para aprender outros gêneros e estilos musicais. O ecletismo musical e a diversificação de atividades ao qual o instrumentista é impelido são estratégias de “sobrevivência” para se manter no mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que são também “ferramentas” utilizadas na ampliação do discurso musical dos próprios músicos e do gênero como um todo.
O georeferenciamento do trabalho de campo, aliado à visão mais ampla do fenômeno, traz uma perspectiva interessante para obter um conhecimento espacial mais preciso da amostra frente ao fenômeno estudado. Mesmo que a Figura 1 não apresenta absolutamente todos os lugares onde ocorrem músicas instrumentais, ela mostra a localização das ofertas de postos de trabalho de uma maneira mais aproximada.
Outro aspecto que nos chama atenção é a relação entre oferta e demanda de postos de trabalho para os instrumentistas. Foram catalogados ao todo 87 equipamentos urbanos, que foram locais de alguma apresentação do total de 319 conjuntos/artistas de música instrumental no período citado. Na categoria de equipamentos urbanos foram classificados teatros, casas de show, bares, clubes, praças, parques ou até mesmo a própria rua. Isso significa que, para cada estabelecimento, concorrem para se apresentar 3,66 conjuntos/artistas. Vendo dessa forma parece baixa a concorrência. Mas não é o que acontece. Na seleção para as programações musicais a disputa é bastante acirrada devido ao crivo realizado pela direção musical dos estabelecimentos.